quarta-feira, 28 de agosto de 2013

• Somos todos fúteis...

Isto tem andado a remoer na minha mente de uma forma incessante, desde que aconteceu...

Reparemos: um canal de TV que cresceu e prospera à sombra dessa coisa tão transcendentemente útil que são os reality shows… põe em horário nobre - para ver, clicar aqui - uma sua jornalista, com um ar absolutamente paternalista e auto-dotada de uma grande superioridade moral, a perguntar a um pobre menino rico se ele tem a noção do quanto é fútil a sua vivência, dedicada a gastar tempo e dinheiro a divertir-se à grande e à francesa!…

Apetece-me dizer "I rest my case"… Mas não. Vou mesmo purgar o que me vai na alma hoje, finalmente.

Para um banqueiro avarento, que dedica a sua vida a amealhar até mais não carcanhol, ver um playboyzito a gastá-lo como se não houvesse amanhã, parecer-lhe-á tal atitude da maior futilidade possível e imaginária. Mas do ponto de vista do playboy, não haverá também menor futilidade em só arrebanhar aquilo com se compram os melões e acabar por não os comprar. E com carradas de razão, a meu ver!…

Afinal, haverá melhor emprego para o vil metal do que tentar comprar com este um pedacinho de felicidade, mesmo que efémera?...

Para um grande sábio, a vida de um camponês eremita consagrada apenas a plantar umas couves para as suas sopinhas pode parecer fútil. Tratar tão-só da sua auto-subsistência, sem tempo para a busca do conhecimento… mas o camponês também vê como fútil o sábio que perde todo o seu tempo a ler calhamaços, sem depois partilhar com ninguém o conhecimento adquirido.

Para um funcionário público de uma qualquer repartição de finanças eu sou fútil. Porque estou desempregado e nada produzo para o bem comum desta nossa sociedade. Mas eu também vejo a sua actividade profissional recheada de uma enorme futilidade. Requerimentos, pareceres, relatórios de contas… Que sumo é que se pode extrair disto tudo, depois de bem espremidinho?…

Fúteis são a esmagadora maioria das actividades humanas. Fútil têm sido algumas das profissões que já exerci. Como a publicidade e as vendas de produtos e serviços, todos eles fúteis.

Fúteis têm sido os meus esforços para voltar a ter uma nova actividade profissional remunerada, com que eu possa garantir a minha existência fútil. E quando deixarem de ser fúteis por finalmente darem resultados, estes serão muito provavelmente eu ter um novo emprego em funções com certeza fúteis.

Até altos cargos são fúteis. Fúteis têm sido muitos exemplos superiores de exercícios de poder. Desse poder detido por reis presidentes, ministros, chanceleres e outros quejandos. Que existem e deviam agir para nos servir a todos nós. Mas que são bastas vezes tão inábeis a fazê-lo.

Fúteis são todos os templos e orações que os homens fazem a deuses que não existem.

Fúteis são todas as guerras. Porque nunca há nestas absolutos vencedores e vencidos. Mas sempre há a fútil perda de vidas humanas. Por causas fúteis. Toda a causa de natureza política, social ou económica que exija o sacrifício de uma só vida humana tem de ser fútil.

Mas não são só os ódios que alimentam as guerras que são fúteis. Também o são aqueles amores que acabam e que não deram frutos.

De um particular ponto de vista, toda a vida pode sempre ser vista como fútil, afinal. Ainda que não o queiramos ver assim.

E, finalmente, fútil foi este presente exercício de escrita. Porque não despertará quaisquer consciências. Porque quase ninguém o lerá. E quem o vier a fazer provavelmente virá a esquecer o que leu.

6 comentários:

Catarina disse...

Eheheh grande análise :)

A mim todo este circo não me disse rigorosamente nada, nem entendo o porquê de todo o alarido exacerbado. Além do mais não defendo que as pessoas passem de bestiais a bestas assim por um erro, num piscar de olhos (sim porque a Judite não esteve bem, mas isso para mim não é suficiente para a passar de bestial a besta)...

Quanto a ele, convenhamos que há meninos riquinhos que levam vidas diferentes, não do ponto de vista da futilidade, porque o modo como gasta o dinheiro cada um é que sabe, mas no sentido de "construir algo". E acho que também não havia razão alguma para de um momento para o outro "endeusar" o rapaz!

Entristece-me deveras, é que com tanta coisa séria a acontecer e merecedora de análises um telejornal dedique uma parte do seu horário a uma entrevista tão fútil! Do mesmo modo que me entristece que esta situação tão estúpida tenha despertado tanto alarido, quando há razões bem mais importantes e merecedoras de levantar tal mobilização!

Quanto há tua análise sobre a futilidade, sim todos somos fúteis, e gostamos de coisas fúteis e que nos dão prazer, felicidade conforto! E não há mal rigorosamente nenhum nisso.

Beijinhos

Catarina disse...

:)

Giuseppe Pietrini disse...

Então, Catarina?…

Isto tudo que eu p'ráqui vociferei vai muito além de dois personagens pequenitos, como uma Judite de Sousa ou um Lorenzo Carvalho!… Mas falemos um pouco deles…

Eu fiquei com pena da Judite... embora não a conheça pessoalmente e não possa fazer um comentário justo ou isento sobre ela enquanto pessoa, nunca tive grande simpatia por ela enquanto jornalista. Para mim, nunca atingiu o estatuto de "bestial". E agora com esta entrevista, coitada, ficou mesmo mal na fotografia. Quando até o que ela queria - ao menos subconscientemente - era que o Lorenzo ficasse mal no boneco dele que ela foi construindo, no quase linchamento público da alegada futilidade do rapaz...

É a velha história: não há notícias no verão, então temos de as inventar...

A Judite teve de fazer este frete ao seu patrão, a TVI. E estava mal preparada para o papel a desempenhar. Julgo que ela achou que as perguntas que colocou ao Lorenzo seriam as que o cidadão comum gostaria de as pôr. Ingenuamente. E o cidadão comum desatou a dizer em coro: "É pá, eu não sou assim tão mesquinho, ok?...".

O "pobre" do Lorenzo esteve à beira de quase ser acusado como culpado pela crise económica portuguesa! Coitado… e será ele afinal um fútil?… às tantas não me importava de ter a futilidade dele, se pudesse fazê-lo como ele faz.

Pessoas como o Lorenzo, com ânsia de reconhecimento público, com vontade de serem considerados VIP, têm sempre, mas sempre, necessidade deste tipo de publicidade. E a Judite, conscientemente ou não, pôs os holofotes todos nele. O bacano deve estar imensamente agradecido.

Mas a Judite não foi a única que teve de fazer um frete assim e se "queimou". Na sua concorrência, a SIC, a xôdona Conceição Lino também lá teve essa incumbência. Ver o video desta entrevista num dia anterior, clicando aqui .

Já agora… Talvez pouca gente se lembre que este Lorenzo também faz uns biscates como jornalista, ao fazer testes a automóveis num programa da SIC Notícias, que julgo que é o "Volante" ou o "Turbo"… Desculpa-me a imprecisão.

Mas bom… Este fait-divers levou-me é a recordar de duas pessoas que estão nos antípodas dele. Pessoas nada fúteis. Que são ou eram mesmo uns incorrigíveis workaholics. Que viviam todas as horas dos seus dias só para o trabalho. Falo de Oliveira e Costa, do BPN, e de João Rendeiro, do BPP.

E eu pergunto… Quem é que nos pôs a todos nós, portugueses, na merda???… Será que foram pessoas fúteis como o Lorenzo, pobre menino rico, nascido em berço de ouro?… ou os novos ricos que não tiveram um berço tão bom? E que talvez por isso terão enriquecido sem escrúpulos de espécie alguma…

B'jitos, Cat! ;-)
Giuseppe

Giuseppe Pietrini disse...

Mas olha, Catarina… O prazer, a felicidade e o conforto são justamente para mim as coisas menos fúteis que existem. Eu sou um hedonista. Porque como se costuma dizer, é o que se leva desta vida. Não é o dinheiro. Ou a fama, que essa também fica cá. Boa ou má.

Maizum jingo, Catarina. ;-)
Giuseppe

Catarina disse...

Esqueci-me de responder aqui :p Mas também não me queria alongar muito, só queria realçar aqui uma coisita:

"Julgo que ela achou que as perguntas que colocou ao Lorenzo seriam as que o cidadão comum gostaria de as pôr. Ingenuamente. E o cidadão comum desatou a dizer em coro: "É pá, eu não sou assim tão mesquinho, ok?...".

A questão é, será que grande parte das pessoas não é mesmo assim mesquinha? Fica atento às redes sociais e repara na enormidade de comentários relacionados com o que este ou aquele gasta nisto ou naquilo, nas férias que faz e afins... Eu já cheguei a ver no perfil de alguns apresentadores e actores pessoas a perguntarem se não se sentiam mal por colocar fotos das férias quando havia tanta miséria em Portugal e afins, comentários mesquinhos a sério!
Eu já cheguei a ler um texto de alguém a dizer que não entendia como é que pessoas desempregadas mantinham net em casa! Sim porque até fica mais barato comprar o jornal todos os dias para procurar emprego.
Enfim, pessoas mesquinhas, meu caro, há sim! Muitas! As mesmas que na altura do Natal ou que foi cruxificaram em praça pública uma mocinha só porque fez uma publicidade em que afirmava que um dos sonhos era ter uma mala da Channel!

A sério meu caro amigo, eu sou muito tolerante com muita coisa, mas a hipocrisia não é de certo uma delas!

Mas pronto, foi mais um episódio que pelo menos deu para manter o pessoal a comentar alguma coisa :p Já eu destes casos o que gosto mais são as inspirações humorísticas :) Já sabes como é, "Ri melhor quem ri apesar de tudo"

Quanto ao conceito de futilidade... Acho que o conceito de futilidade é tão variável, como o gelado preferido... E olha aí está, uma futilidade deliciosa e da qual gosto muuuuuuuuuito :)

Beijinhos grandes espero não te ter maçado, espero que estejas bem.

Giuseppe Pietrini disse...

Aqui e agora não podia estar mais em sintonia contigo, Catarina!... Até fiquei a crer que devemos ter ambos o mesmo gelado preferido...

Sim, o português é mesquinho. Muito mesquinho. Tens toda a razão. E posso contar aqui um pequeno episódio pessoal...

Faz talvez agora uns 8 anos em que eu estive a viver outro período de desemprego, como o actual. Nesse ano, como quase sempre, aluguei uma pequena moradia por duas semanas na Praia da Vieira de Leiria. O meu vizinho do lado era um local que tinha andado emigrado em França e que gozava agora ali a sua merecida reforma. Um dia veio meter conversa com a minha família. Quando soube que eu era um desempregado, ficou escandalizado. Na cabeça dele era inaceitável que eu, enquanto desocupado, tivesse direito a passar férias!!!... Eu para ele era um chulo do estado, a viver dum subsídio de desemprego que ele se julgava estar a pagar com os impostos dele. Não sabendo a pobre alma que esse subsídio é como que um seguro que quando trabalhamos andamos a pagar com os descontos que nos fazem para a segurança social.

Apreciei a tua versão do provérbio popular, "Ri melhor quem ri apesar de tudo". Parece-me imbuída assim de uma boa lição filosófica.

Beijinhos grandes pa'ti também! Espero que deixes de pensar que me podes maçar alguma vez. Mais espero que saibas que eu só posso estar bem quando rodeado de amigos como tu. Que sabemos que estão sempre lá, mesmo quando há um silêncio entre nós. Tu nunca deixas de estar presente nos meus pensamentos. E se eu fosse crente, nas minhas preces.

Maizum jinho, para rematar.
Giuseppe