quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

• E eu, que serei?…

Passei os olhos anteontem por um texto de Sílvia Baptista - uma notável senhora que se diz feminista e ao mesmo tempo escrever sobre sexo num blog -, com o título “Fodamos!”.

Se o lermos, veremos neste alguns pensamentos sobre essa coisa chamada sexo que já poderão ter assaltado tantos de nós - ou ao menos a mim, sim - mas que nunca chegámos a verbalizar.

Falamos cada vez mais abertamente sobre o tema sexo. Mas os recalques que a sempre vigente moral católica apostólica romana nos instalou - não sendo esta fé a única a fazê-lo - nas mentes ainda nos faz causar alguma surpresa e choque quando lemos palavras tão directas quanto estas de Sílvia.

Numa linha, Sílvia diz-nos que o sexo é algo vital. Que devia ter um lugar nas principais resoluções do Novo Ano para todos nós.

Num outro dia antes deste, no meio dum paleio bem prazeroso com uma mente feminina e livre, bem semelhante à minha, esta resolveu me confessar que não era nenhuma santa na cama. E eu na altura não retorqui. No momento vi aquilo como too much info, I don’t need to know that right now.

É que por acaso o tema sexo nem vinha muito à baila, no contexto geral da conversa até então escorrida… Mas esta minha boa amiga entendeu por bem expôr o meu adormecido espírito a uma evidência: todos de um modo geral temos necessidade, melhor, temos desejo de uma vida sexual bem resolvida.

E uma vez que ela não não seria nenhuma santa, pus-me a cogitar sob o mote “e eu, que serei?”… Até este instante de inspiração em que escrevo estas linhas.

Vamos pedir auxílio a uma imagem. Conhecem aquela sensação que temos quando experimentamos banharmo-nos pela primeira vez num recanto discreto dum riacho de águas bem transparentes e sobretudo despoluídas? Pois talvez seja pretensioso da minha parte mas creio que é a mesma sensação que uma neófita em mim poderá experimentar em meus braços.

Porque se há uma coisa que eu julgo hoje ser é despoluído. De angústias, anseios, dúvidas existenciais, etc. e tal. Tudo factores que provocam ruído nefasto no acto sexual. Ou na vida, em geral.

Consigo hoje, julgo, eliminar esse ruído e talvez conduzir outros a fazê-lo também, em sintonia comigo. Com recurso a alguma persuasão. É uma doutrina que desenvolvi. Estar tal como num exercício de meditação, em que procuramos esvaziar o nosso pensamento, levando-o a um estado temporário de higiénica letargia. 

É esta hoje - nem sempre o foi assim - a minha forma de idealizar a perfeita interacção entre dois seres em que arde o desejo partilhado de se sentirem a viver fundindo-se num só.

De acordo, isto dito assim não é nada específico. É muito vago. E pode parecer banal, eu sei. Mas não é. É uma clara demarcação que julgo existir entre mim e os outros. As pessoas vivem demasiado angustiadas, a meu ver, com lembranças do passado e incertezas no futuro. E eu procuro reger-me por estas palavras que vi um dia atribuídas a Confúcio: "angústias são sinal de má economia da alma".

Fazer sexo com o corpo apenas é possível. Mas não é a mesma coisa que com a alma também. E com uma alma imaculavelmente limpa, então... Não haverá nada melhor.

Momentos tenho de elevada auto-estima em que acredito que eu seria o melhor amante do mundo. Se ao menos houvesse alguém hoje que me desejasse até às últimas consequências. E que me causasse reciprocidade. Mas não há. Porque há mais vida para além do sexo.

Vamos a mais uma imagem metafísica… Terão, caras leitoras* destas linhas mal arrazoadas, já alguma vez experimentado descobrir um casarão abandonado no meio dum lugar com umas vistas magníficas e que vos apeteceu logo restaurá-lo e fazer dele a vossa morada de sonho? Pois é, o meu coração é como esse vetusto edifício desabitado por longos anos.

Requerirá de início algum empenho, esforço e dedicação a quem o queira reavivar. Mas a glória de um recompensador bem-estar pode espreitar a quem com ganas se atire a essa façanha ilustre. 

É isto que eu, liricamente falando, julgo que sou aqui e agora. Na tépida paz de um novo ano que debuta promissor, se prosseguir na senda da derradeira etapa do ano findo. O mundo que me aguarde, que eu estou pronto.
______________________________________________________

* Sim, leitoras e não leitores. Porque este texto é um monólogo, mas escrito para um público-alvo bem definido. Para quem eu desejo que me deseje até às últimas consequências. Ou vá lá, mesmo que assim tão-só e apenas de levezinho... Que eu devo ser uma valente carga de trabalhos de aturar o tempo todo.

Sem comentários: